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quarta-feira, setembro 14, 2011

Mais perguntas, ainda sem resposta!

Os vasos campaniformes seriam um bom pretexto para uma profunda reflexão sobre a triologia Nascimento, Crescimento e Deposição pós-Morte, não fora ser ainda muito prematuro escavar fundo no capítulo do seu Nascimento. Por isso, vou tentar traduzir um pouco de uma discusão intra-pessoal àcerca destas relações. O campaniforme, em sentido lato, não pôde ter surgido expontaneamente ao mesmo tempo numa diversidade de sítios pela Europa fora. Como no Neolítico final, já existia um acentuado poder de domínio de conhecimento sobre a elaboração e manipulação das pastas cerâmicas e do seu cozimento, a transição para o calcolítico fez-se sem avanços significativos neste domínio e portanto a cerâmica campaniforme do ponto de vista básico não veio trazer novos avanços metodológicos, só aditando um novo patamar no aspecto da criatividade artística, podendo caracterizar-se esta corrente por uma ideia geral de preenchimento decorativo em profundos espaços, nas superfícies das suas formas características em cartelas horizontais ou em zigue zague.
As “pegadas” que Os Povos do Campaniforme, nos deixaram na difusão da sua Cultura ou na sua eventual caminhada expansionista pela Europa, ou noutra qualquer proposta “moderna”, demonstram que em locais de permanência, como Ferreira do Alentejo, foram produzidos, recorrendo aos barreiros locais muitos e muitos novos vasos agora feitos cacos, e depositados em planos estratificados como marcadores culturais. A partir deste facto, nasce então a pergunta - onde “pertencem” os cacos desses vasos?

Ao local onde os seus criadores nasceram e eventualmente não morreram, ou o contrário?

Acho que ainda serão estabelecidas linhas de ADN que poderão associar os cumes mais velhos das pirâmides humanas até aos nossos dias, e quem sabe provar, por mero exemplo, que em Ferreira do Alentejo vivem ainda alguns descendentes dos povos calcolíticos que por ali também viveram, e se assim fosse, essa gente actual seriam herdeiros materiais do mobiliário funerário dos seus antepassados, embora a sede de avaliação para esta ideia gravite num domínio meta-jurídico.


Ao fazer uma retrospectiva sobre a relação entre a proveniência das cerâmicas campaniformes encontradas em Portugal nas necrópoles e nos povoados mais proeminentes e o local onde hoje estão expostas, verifica-se uma acentuada proximidade, pois se excluirmos Vila Nova de S.Pedro  (Museu do Convento do Carmo), os materiais da zona de Cascais estão num Museu “Gourmet” o Visconde de Castro de Guimarães, os do Zambujal em Torres Vedras,e em Lisboa estão os do Distrito de Lisboa e alguns da Península de Setúbal e os restantes guardados a sete chaves no Museu Arqueológico de Setúbal encerrado inexplicávelmente há muitos e muitos anos. O que dizer então do distanciamento de um magnífico conjunto de campaniforme dos arredores de Carmona, onde até existe um Museu Arqueológico implantado num belíssimo Palácio Medieval, exposto actualmente no Museu da Sociedade Hispânica de Nova York?


Um Museu de artes plásticas sem idade assinada, não se constroi com fichas coladas nas paredes cheias de palavras, pois então bastaria imprimi-las em papel e distribuí-las pelas ruas, e por isso os Museus estão cheios de objectos únicos que pretendem despertar a reacção dos seus visitantes e fazer com que estes se recordem para sempre do que viram, e possam mais tarde aprofundar os conhecimentos ali adquiridos.


Na imagem seguinte, de uma “vitrine campaniforme” temporária no MNA, estiveram à nossa disposição os vários ângulos de observação de um conjunto diversificado de peças arqueológicas devidamente legendadas, e nenhuma delas se destacava das outras pela importância que se julga terem tido para quem as produziu, excepto em planos da sua representação no Mundo do Simbólico, mas cada uma das suas “irmãs” que ficaram por expor e que “dormem” em inúmeras reservas, têm igual importância histórica e informativa.



Não quero invadir o discurso da museologia, pois para isso não estou habilitado, mas compreendo que para as mostras mais estáticas deve ser muito complexa a análise do equilíbrio entre o que se pode expôr e aquilo que os visitantes, no seu todo, são “capazes” de apreender, pois este é o seu objecto principal, e cada peça exposta tem um papel formativo a cumprir. O que já discuto e rejeito, é que os “donos” dos Museus se julguem seus proprietários, e retirem a quem lhes passa à porta o direito de apreciar a propriedade pública, mesmo que para isso invoquem faltar apenas, uma “data”conveniente, uma legenda, uma lâmpada, uma peça, um funcionário, ou um catálogo raisoné!


Termino, lembrando que na exposição a que se refere a imagem anterior da capa de um catálogo de uma oportuna exposição, as três peças até agora consideradas os ícone Islâmicos de Tavira – o Vaso, o Cantil e a Floreira –estavam então em vitrines do MNA integradas na exposição “Portugal Islâmico – Os Últimos Sinais do Mediterrâneo”.


A floreira de Tavira


A dilatação das “Fés” que levou Cristãos até à Arábia, e trouxe Muçulmanos até à Península Ibérica, deixou por lá e por cá marcas da sua passagem que no nosso caso fazem, e tudo leva a crer que farão, parte do espólio de alguns dos nossos Museus do Sul, e até agora ainda não se ouviram nos Minaretes reclamarem a devolução das sigillatas foceanas tardias originárias do Médio Oriente.

Torna-se portanto muito difícil, padronizar de forma coerente o local de exposição de uma peça arqueológica que escapou à incineração do envelhecimento moral ou material, e está disponível para ser compreendida e admirada independentemente do local onde foi fabricada, depois utilizada e finalmente “abandonada”. O que mais importa pois, é a contribuição dos Museus para que o conhecimento da Humanidade, mesmo que se torne por isso conflitual, possa sempre continuar pacientemente progredindo.

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