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quinta-feira, fevereiro 27, 2014

MINAS DE SÃO DOMINGOS


Um dia destes, a minha Companheira até à eternidade, confessava ter “ultrapassado” com sucesso a dúvida sobre os limites da sua criatividade. Disse Ela para uma das Filhas que, havia criado um novo conjunto de azulejos temáticos quando julgava já não lhe ser possível estender-se nas deambulações do pincel dentro daquele limitado espaço de 15x15 cm para representar a forma como o Sol a estimula.
Depois deste acontecimento, minímamente retratável pelos motivos óbvios da reserva de propriedade, fiquei perante um novo desafio no confronto com um certo, e confessado, culto da ideia de que na fotografia tradicional está conceptualmente quase tudo já visto e revisto, embora aceite que continua a ser possível personalizar cada plano, e até representar digitalmente o que nos tempos analógicos se produzia, filtrando a luz, trabalhando nos tanques de revelação e ensaiando papeis e projectores. Para este auto-teste, e deixando a cor um pouco de parte, escolhi um ambiente desconhecido, e decidi tentar expressar as escalas dos brancos, cinzentos e pretos, para o que bastou definir um perfil BW na minha máquina digital.





Para esta experiência, procurei vários planos na relação visual em campo aberto com o conjunto “edificado” num notável campo mineiro abandonado, e no final, quando procurei referências para fazer o balanço dos resultados, encontrei uma corrente estética alternativa ao BW, que procurando acentuar a degradação quiçá “criminosa” do património edificado, mantém apenas os contornos cromáticos na forma como todos os vemos. Entre esta forma de expressão, que decorre das novas ferramentas de acolher as imagens, que as alteram de forma fácil e “moderna”, e a primeira idade da fotografia, preferi voltar ao passado e depois de umas horas descobrindo o que ainda resta das MINAS DE SÃO DOMINGOSir vir por aqui apresentar  o resultado. 
De qualquer forma, para começar, também me pareceu ilustrável uma forma actual de caracterizar a vida recente dos Portugueses com a visão negra dos planos próximos de nós e uma janela de horizonte que teimamos em querer  colorir, que mais não seja para benefício de outras gerações. As imagens retiradas do que resta na confusão na amplitude dos campos mineiros serão publicadas na forma pura.








Sobre as Minas, já estará investigado muito do quase tão pouco que os exploradores deixaram sobre o que ela representou, mas chama-se sempre a atenção para a insequência 5º/4º/3º Milénios (?), Sec I (?), Sec. XIX. O mais aprofundado estudo sobre a implantação das minas da autoria de Jorge Custódio, é muito recente (2013), um extenso trabalho de análise sobre os bens e os documentos que escaparam à forma vândala como os Ingleses abandonaram a exploração e que, para quem goste da história da evolução material e social do País, e do Alentejo profundo em particular, é credor da maior dedicação temporal que se lhe possa reservar, e está editado pela SOCIUS, Centro de investigação em Sociologia Económica e das Organizações. Nesse belo livro, fica bem esclarecido que a ganância capitalista da ocupação territorial dos Ingleses destruiu, talvez para sempre, a informação obtenível sobre os períodos pré-romano e romano, diminuindo assim, não só o nosso presente como também fontes rentáveis do nosso passado.
Da introdução desta obra, transcrevo um pequeno trecho que considero bem importante no contexto da minha própria visão sobre o que o Alentejo merece e tem para usufruir de uma visão integrada das diversas parcelas que nos tempos modernos se considera fazerem parte do património cultural, tais como, a paisagem cultivada e a ruína, a gastronomia, a Museologia, a hotelaria, e as actividades de ar livre “O valor acrescentado pelo novo ciclo cultural, como a riqueza documental da sua história mineiras dos sec XIX e XX requerem ser observados à luz do aprofundamento científico , em função dos diferentes aspectos do património, com a finalidade de criar riqueza cultural, isto é, um tipo novo de Valor Económico (Carta de Bruxelas, 2009) associado à herança patrimonial, necessária à continuidade dos vestígios e bens culturais que garantem, actualmente, a classificação do conjunto das Minas de São Domingos, como «Conjunto de Interesse Público», consagrado pela lei portuguesa em 3 de Junho de 2013”.
Sobre a vida dos mineiros e as condicionantes da organização social nos Povoados, o Campo Arqueológico de Mértola, editou da autoria de Helena Alves, MINAS DE S. DOMINGOS GÉNESE, FORMAÇÃO SOCIAL E IDENTIDADE MINEIRA,  e da sua Introdução também transcrevo um excerto de um poema de Álvaro de Campos que de alguma forma retrata um doa aspectos de uma visita às Minas, isto é, ao contrário de uma volta por qualquer grande aglomerado de casas abandonadas, os Ingleses levaram tudo o que puderam, e nem uma simples porca ou um prego se encontram pelo chão; de “recordação” material, podem trazer-se pedaços de rocha!
 
Venho dos lados de Beja
Vou para o meio de Lisboa
Não trago nada e não acharei nada
Tenho o cansaço antecipado do que não acharei,
E a saudade que sinto não é nem do passado nem do futuro.

A visita desguiada às MINAS DE SÃO DOMINGOS, é um passeio de liberdade, constituído por erráticas escolhas de percursos por entre tabuletas presentes e outras fugidas para parte incerta, e para meter o nariz em tudo, e observar os cantos da paisagem, será preciso bem mais do que uma manhã de árduo trabalho. A impressão final, é, para além da presença permanente das mais diversas e brutais marcas poluentes, a de um encontrão com uma das faces do mais puro capitalismo selvagem que se vai servindo do Planeta para negócios de “ocasião”, e quem vier atrás que se lixe, pois nem um puxador ficou para fechar a porta, aliás desnecessário pois também não há porta, e janelas sim mas abertas e ventosas como nas ameias dos castelos! A confirmação do que está escrito é evidente, nada do que o tempo ou o uso tivesse fundido ou tornado pó, resta, até as poucas travessas da notável rede ferroviária que ligou as Minas ao Pomarão estão esmagadas e soldadas ao minério ferrugento formando uma calçada que as chuvas por mais ácidas que venham não lhe roubam o lustre.
Do ponto de vista dos conceitos sociais, basta ficar a saber que a casa atribuída a cada mineiro tinha uma porta e uma chaminé! Claro que tendo chegado a trabalhar nas Minas perto de cinco milhares de almas, houve o essencial para os manter “saudáveis” e disponíveis – Mercado, Hospital, Igreja, dois Cemitérios um para Ingleses e um para os outros, e claro Força Policial para manter tudo na "ordem".
Não sei se é ou não melhor preparar a visita, com a leitura de pelo menos a documentação que identifica os principais polos de ruínas, mas há pelo menos uma característica ambiental que não encontrei descrita nos guias, os cheiros, e como a côr é cada um de nós que a mistura com o lado de que está o sol, a viagem entre a Corta e a Achada do Gamo isolada da influência visual dos complexos industriais abandonados, é uma caminhada por entre um Baixo Alentejo ausente porque distante, e faz-se por cima de estratos extraídos do subsolo, esmagados, transformados, inertes e repelentes a qualquer tentativa de vida vegetal, e, consequentemente também animal, e é bom lembrar que os exploradores abandonaram o local há mais de quatro décadas. Tendo permanecido os cheiros, resta-nos então ir andando e apurando o nariz, pois numa primeira etapa a aridez é inodora, e só na aproximação à Achada do Gamo começamos a despertar para tentar compreender os odores que parecem batidos com uma varinha mágica, até que o enxofre aparece, e já não nos larga até ser insuportável, e assobiando às narinas dá o sinal de partida para o regresso.
O coração da Serra de São Domingos, é hoje quase uma planície, pois o recheio mais valioso do chapéu de ferro que a notabilizou, e começou por atrair os pré Romanos, foi esmigalhado e levado a partir do século XIX em vagões até ao Guadiana, para daí alimentar o desenvolvimento de outras economias, encarregando-se a natureza de encher as barragens chamadas das Tapadas grande e pequena, que são hoje uma mais valia para as condições habitacionais dos Aldeões resistentes.       
Cabendo no conceito do “tempo” de que vou  dispondo, palmilhar os campos de que gosto, para tentar apanhar imagens que permitam a sua divulgação, e empreendida a disponibilidade da obra de Jorge Custódio, o “Território, História e Património Mineiro”, e também da investigação da Helena Alves para complementar o conhecimento, ficam os próximos dias aqui reservados para fazerem parte deste pequeno "projecto" de ampliação sonora das MINAS DE SÃO DOMINGOS, sem que possa garantir voltar ainda para contar o que a segunda visita tenha de nóvel, em especial as imagens dos percursos que obrigam a fazer a pé mais longos trajectos dentro do parque industrial. As próximas imagens das MINAS DE SÃO DOMINGOS,  não serão legendadas porque fazem parte de uma unidade espacial desarticulada pelo abandono e procuram individualizar-se apenas pelas decisões tomadas depois da apreciação visual do conjunto.  
A actividade mineira, estendia-se edificada até ao Pomarão através de várias estações de apoio à articulação ferroviária e as duas imagens seguintes respeitam a um desses apoios, também naturalmente já abandonado e destruído.
 






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