Abriu recentemente em Ourique o Centro de Arqueologia Caetano de Melo Beirão, expondo ao público o projecto GODESS – Depósito Votivo da II Idade do Ferro.
O sítio arqueológico de Garvão foi escavado por três equipas de Arqueólogos, sendo uma delas dirigida por Joaquina Soares e Carlos Tavares da Silva, do MAEDS, pelo que no Museu de Setúbal já há muito estão expostos numa vitrine uma parte do espólio que foi sendo conservado em Setúbal.
O primeiro relatório das escavações foi publicado no Arqueólogo Português, e versão em pdf está acessível em http://www.patrimoniocultural.pt/static/data/publicacoes/o_arqueologo_portugues/serie_4/volume_3/deposito_votivo.pdf
Garvão era, desde tempo anterior à chegada dos romanos, um ponto de encontro e uma referência de carácter territorial no sudoeste peninsular. O santuário que existia na zona do Cerro do Castelo, dedicado a uma divindade feminina, talvez Tanit ou Astarté, acolhia, em altura do ano decerto importante do calendário agrícola, gentes de todas as classes e idades vindas de várias regiões, que chegavam para participar nas festividades.
As cerimónias celebrativas de um momento importante da vida rural e dos ciclos da lavoura envolviam práticas cultuais coletivas de aproximação às divindades, incluindo a deposição de prendas de agradecimento e de pedido de amparo.
Pães e frutas, alimentos vários, bebidas, ervas aromáticas, plantas e outros materiais perecíveis, bem como um amplo conjunto de objetos, como ex-votos figurados em barro, pasta de vidro e metais, contentores cerâmicos de alimentos, copos de beber e cossoiros, são alguns exemplos da diversidade de ofertas trazidas à(s) divindade(s), e entregues de modo privado ou em ato coletivo de ofertamento.
Haveria no santuário zonas próprias para a celebração das cerimónias rituais e para o depósito das oferendas. Estes espaços eram esvaziados periodicamente para poderem receber novas oferendas. As peças removidas eram acondicionadas, em cerimónia solene, em locais especificamente construídos para as acolher.
O depósito que se encontrou na fossa escavada na vertente SE do Cerro do Castelo continha milhares de objetos, dos quais se destacam as louças mesa e os contentores, os queimadores, que seriam usados na combustão de uma qualquer substância de natureza incensória ou outra, e os ex-votos anatómicos (representações de olhos em 2 placas de ouro e 11 de prata, 2 maxilares, um em pasta vítrea e outro em cerâmica) alguns artefactos de vidro, cossoiros, objetos miniaturais (vários copos e uma caixa paralelepipédica, uma cabeça e um corpo de equídio), arrumados de acordo com uma lógica que confere a este contexto do santuário de Garvão as características de favissa, designação atualmente atribuída a este tipo de depósitos.
No nível inferior da fossa foi encontrado o crânio de um individuo de 35/40 anos com indícios de ter sido morto com três golpes desferidos na zona occipital e parietal por um instrumento contundente dotado de gume curvo, pesado e pouco penetrante, que incidiu obliquamente sobre a cabeça. Este achado sugere a libação sagrada associada a um sacrifício humano, que terá precedido a arrumação das oferendas.
O tratamento de milhares de objetos, na maioria, em fragmentos, é um trabalho especializado e moroso que compreende identificação, comparação e seriação, análise de tipos de fabrico, tratamentos de conservação, e culmina, nos casos mais representativos, com a reconstituição de formas para melhor leitura e apresentação pública.
Observando as técnicas de modelação, podemos definir o grupo das cerâmicas modeladas a torno, outro das modeladas manualmente e, ainda, o dos designados grandes contentores, produzidos a torno lento. Dentro destes grupos, encontramos uma diversidade formal associável à utilização, já referida anteriormente. Do ponto de vista decorativo, regista-se uma variedade assinalável mas, de certa maneira, relacionada com a tipologia de fabrico. Verifica-se que as decorações incisas e de aplicações de elementos relevados na superfície são predominantes nas cerâmicas modeladas manualmente. Em contrapartida, a decoração pintada encontra-se somente nas de modelação a torno ou a torno lento. É também neste grupo que se regista a maioria da decoração por estampilha. Nas cerâmicas pintadas, verifica-se a utilização de três pigmentos que dão origem às cores vermelho, preto e branco. A análise da composição química e mineralógica dos mesmos revelou tratar-se de pigmentos que, sendo comuns, podem ser encontrados perto do centro religioso de Garvão, o que poderia sugerir uma produção regional destas oferendas. No entanto, estes objetos fazem parte do conjunto mais amplo das cerâmicas modeladas a torno. A análise da composição das respetivas pastas cerâmicas revelou a utilização de matérias-primas de diferente granulometria: um núcleo central mais grosseiro, na base, e um material mais fino nas paredes da peça. Tendo em conta a mineralogia dos elementos mais grosseiros, designadamente a presença de elementos de rochas plutónicas máficas incompatível com a geologia da zona próxima de Garvão, conclui-se que estas cerâmicas foram produzidas no interior das regiões célticas da Península Ibérica e não localmente. O estudo dos resíduos orgânicos presentes em alguns contentores detetou a existência de produtos provenientes da família das Pinaceae, p.ex., a vulgar resina de pinheiro.
Estes resultados permitem afirmar que os objetos foram utilizados, embora não permitam determinar se a resina foi usada pelas suas propriedades aromáticas e antissépticas, ou se foi utilizada, depois de aquecida, como impermeabilizante das paredes interiores do vaso. Da mesma forma, não é possível confirmar se essa utilização se relacionava com o culto ou se era inerente ao uso anterior à deposição no santuário.
O projeto previa, desde o início, a apresentação à comunidade, da forma mais completa e ajustada ás condições do CACMB, o trabalho que se vai desenvolvendo e os seus resultados. Com esse objetivo, realizou-se um vasto e inovador processo para a criação de modelos materiais e virtuais que ofereçam ao público o acesso a informação complementar sobre o contexto do Depósito Votivo e o seu conteúdo.
Os modelos que acompanham a exposição representam o esforço para inovar e para facultar, à comunidade científica e ao público em geral, o acesso ao conhecimento reunido sobre o Depósito Votivo de Garvão.
Pães e frutas, alimentos vários, bebidas, ervas aromáticas, plantas e outros materiais perecíveis, bem como um amplo conjunto de objetos, como ex-votos figurados em barro, pasta de vidro e metais, contentores cerâmicos de alimentos, copos de beber e cossoiros, são alguns exemplos da diversidade de ofertas trazidas à(s) divindade(s), e entregues de modo privado ou em ato coletivo de ofertamento.
Haveria no santuário zonas próprias para a celebração das cerimónias rituais e para o depósito das oferendas. Estes espaços eram esvaziados periodicamente para poderem receber novas oferendas. As peças removidas eram acondicionadas, em cerimónia solene, em locais especificamente construídos para as acolher.
O depósito que se encontrou na fossa escavada na vertente SE do Cerro do Castelo continha milhares de objetos, dos quais se destacam as louças mesa e os contentores, os queimadores, que seriam usados na combustão de uma qualquer substância de natureza incensória ou outra, e os ex-votos anatómicos (representações de olhos em 2 placas de ouro e 11 de prata, 2 maxilares, um em pasta vítrea e outro em cerâmica) alguns artefactos de vidro, cossoiros, objetos miniaturais (vários copos e uma caixa paralelepipédica, uma cabeça e um corpo de equídio), arrumados de acordo com uma lógica que confere a este contexto do santuário de Garvão as características de favissa, designação atualmente atribuída a este tipo de depósitos.
No nível inferior da fossa foi encontrado o crânio de um individuo de 35/40 anos com indícios de ter sido morto com três golpes desferidos na zona occipital e parietal por um instrumento contundente dotado de gume curvo, pesado e pouco penetrante, que incidiu obliquamente sobre a cabeça. Este achado sugere a libação sagrada associada a um sacrifício humano, que terá precedido a arrumação das oferendas.
O tratamento de milhares de objetos, na maioria, em fragmentos, é um trabalho especializado e moroso que compreende identificação, comparação e seriação, análise de tipos de fabrico, tratamentos de conservação, e culmina, nos casos mais representativos, com a reconstituição de formas para melhor leitura e apresentação pública.
Observando as técnicas de modelação, podemos definir o grupo das cerâmicas modeladas a torno, outro das modeladas manualmente e, ainda, o dos designados grandes contentores, produzidos a torno lento. Dentro destes grupos, encontramos uma diversidade formal associável à utilização, já referida anteriormente. Do ponto de vista decorativo, regista-se uma variedade assinalável mas, de certa maneira, relacionada com a tipologia de fabrico. Verifica-se que as decorações incisas e de aplicações de elementos relevados na superfície são predominantes nas cerâmicas modeladas manualmente. Em contrapartida, a decoração pintada encontra-se somente nas de modelação a torno ou a torno lento. É também neste grupo que se regista a maioria da decoração por estampilha. Nas cerâmicas pintadas, verifica-se a utilização de três pigmentos que dão origem às cores vermelho, preto e branco. A análise da composição química e mineralógica dos mesmos revelou tratar-se de pigmentos que, sendo comuns, podem ser encontrados perto do centro religioso de Garvão, o que poderia sugerir uma produção regional destas oferendas. No entanto, estes objetos fazem parte do conjunto mais amplo das cerâmicas modeladas a torno. A análise da composição das respetivas pastas cerâmicas revelou a utilização de matérias-primas de diferente granulometria: um núcleo central mais grosseiro, na base, e um material mais fino nas paredes da peça. Tendo em conta a mineralogia dos elementos mais grosseiros, designadamente a presença de elementos de rochas plutónicas máficas incompatível com a geologia da zona próxima de Garvão, conclui-se que estas cerâmicas foram produzidas no interior das regiões célticas da Península Ibérica e não localmente. O estudo dos resíduos orgânicos presentes em alguns contentores detetou a existência de produtos provenientes da família das Pinaceae, p.ex., a vulgar resina de pinheiro.
Estes resultados permitem afirmar que os objetos foram utilizados, embora não permitam determinar se a resina foi usada pelas suas propriedades aromáticas e antissépticas, ou se foi utilizada, depois de aquecida, como impermeabilizante das paredes interiores do vaso. Da mesma forma, não é possível confirmar se essa utilização se relacionava com o culto ou se era inerente ao uso anterior à deposição no santuário.
O projeto previa, desde o início, a apresentação à comunidade, da forma mais completa e ajustada ás condições do CACMB, o trabalho que se vai desenvolvendo e os seus resultados. Com esse objetivo, realizou-se um vasto e inovador processo para a criação de modelos materiais e virtuais que ofereçam ao público o acesso a informação complementar sobre o contexto do Depósito Votivo e o seu conteúdo.
Os modelos que acompanham a exposição representam o esforço para inovar e para facultar, à comunidade científica e ao público em geral, o acesso ao conhecimento reunido sobre o Depósito Votivo de Garvão.
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